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MPV nº 746 de 2016: “Promove alterações na estrutura do Ensino Médio”; “Amplia a carga horária mínima anual, progressivamente, para 1.400 horas”; “Determina que o ensino da Língua Portuguesa e Matemática será obrigatório nos três anos”; “Restringe a obrigatoriedade do ensino da Arte e da Educação Física à Educação Infantil e ao Ensino Fundamental”; “Currículo terá itinerários formativos específicos definidos em cada sistema de ensino com ênfase nas áreas de Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e formação técnica e profissional”. Estas são algumas das propostas da Medida Provisória que visa reestruturar o Ensino Médio, proposta pelo presidente Michel Temer, e polêmica desde a sua criação. Com 3.569 votos a favor e 69.425 votos contrários até o momento no site do Senado, o documento é considerado pela grande maioria dos professores como um retrocesso na educação brasileira e foi tema de roda de conversa no último dia 28 de outubro, sexta-feira.

O encontro, idealizado pelo docente Marcelo Mocarzel, envolveu professores e alunos dos cursos de licenciatura em Pedagogia e História do Unilasalle-RJ. A abertura ficou por conta da coordenadora de Pedagogia, Maria de Fátima Pimenta, e de fala da estudante Ana Júlia Ribeiro, de 16 anos, em vídeo exibido aos discentes no Auditório La Salle – Ensino Médio. A gravação de seu discurso em defesa do movimento secundarista na Assembleia Legislativa do Paraná viralizou na internet. Ao receber a palavra no dia 26 de outubro, Ana Júlia rebateu com diversos argumentos a MPV – “Precisamos urgentemente de uma reforma. Entretanto, não desta forma. Uma reforma que pudesse chamar a nossa atenção e não que ativasse a nossa preocupação”.        

  

                            

Após uma exposição de Mocarzel sobre os artigos mais conflitantes da medida (confira na íntegra aqui), e a formação de uma roda de mestres – Marcelo Mocarzel, Ana Paula Lanter, Cecilia Guimarães, Júlio D’Amato, Fátima Pimenta e Adriana Arezzo –, Cecilia Silva Guimarães, de História, estabeleceu um link entre o vídeo e o grande problema por trás da medida, ao seu ver: “Uma das coisas mais importantes que a Ana Júlia aponta na Assembleia é a não participação daqueles que estão envolvidos no processo da educação, ou seja, quem foi consultado para que se montasse este documento?”, questionou a professora, lembrando que a medida “está relacionada à primeira versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), já cheia de comprometimentos em todas as áreas, da Educação Infantil ao Ensino Médio”.

Mestre em Sociologia, além de docente dos cursos de Administração, Direito, Pedagogia e Sistemas de Informação, Adriana Arezzo, foi firme em suas críticas. Dando aulas para Ensino Médio há 28 anos, ela considera que a MPV 746/2016 “não leva em conta uma luta de mais de 30 anos neste país”. Na opinião de Adriana, haverá uma “fragmentação das escolas que vão preparar as elites das que não vão, já que as escolas particulares, com maior poder de escolha em relação à medida, conseguirão formar muito melhor o aluno”.

 

A afirmativa é baseada em brechas deixadas no documento. Em um dos artigos, por exemplo, a implementação aparece como “progressiva”, o que pode significar daqui a um ano ou daqui a cinquenta, como explicou Mocarzel. Cada escola particular estipula seu próprio prazo, mas em relação às públicas, se o Estado aderir à medida, todos os colégios estaduais designados passariam a ter de cumpri-la naquele momento. Já ao citar “formação muito melhor”, a professora se referiu às controvérsias envolvendo a carga horária. Mesmo as escolas optando pelo tempo integral proposto, com sete horas de aula, cinco horas seriam reservadas às disciplinas obrigatórias, como Português e Matemática, restando apenas duas horas para o ensino das demais matérias.

ALUNOS ENTRAM NA RODA

As opiniões não se restringiram apenas ao palco. Na plateia, vários discentes quiseram se pronunciar, como Leonardo Borba, do 6º período de Pedagogia. “Logo quando eu comecei a ler sobre o assunto, percebi como é um desserviço para a educação brasileira”, comentou, “Esta é uma canetada pensada porque o jogo que está por trás da medida é uma ditadura velada. Olhar os números dá um desânimo enorme, de 11 milhões de jovens na faixa etária dos 15 aos 17 anos, 1/3 atinge a alfabetização plena, 35% deles não chegam ao Ensino Médio, nesta perspectiva o número irá dobrar”.

Gabriela Albuquerque está ainda no início da faculdade, mas já estudou muito sobre a Medida Provisória por considerar crucial “interpretar as entrelinhas”. Graduada em jornalismo, a aluna do 2º período de Pedagogia, trouxe como contribuição para o debate uma análise do que tem saído na mídia. “A secretária executiva do Ministério da Educação, Maria Helena de Castro, afirma: ‘nos últimos anos o fracasso do Ensino Médio Brasileiro é um dado da realidade apontado por todos os especialistas da área’. Sim, isso já vem sendo discutido há 20 anos, mas ela complementa que ‘a Medida Provisória foi um ato para começar a pensar nisso’. Medida Provisória para começar a pensar?”, indagou. Para Gabriela, outro ponto que não casa é a proposta de ensino integral: “Aí tem uma PEC 241, estabelecendo um novo teto do gasto público, como fica? Segundo o Ministro da Educação não vai aumentar, mas não entendi esta matemática”.

A estudante também lançou na roda a possibilidade de interesses de terceiros na medida. “Não vi até agora nada na imprensa que traga estudos sobre a falta da mão de obra. Até que ponto a Confederação Nacional da Indústria, os empresários não estão também envolvidos com uma questão como esta? O jovem de ensino público, porque obviamente o ensino privado vai se destacar, só vai ser usado para mão de obra?”. Gabriela conclui sua explanação considerando a MPV 746/2016 antropofágica, por “comer tudo o que poderia ser útil para o jovem brasileiro”.

O encontro serviu, no entanto, para também dar esperança. Como recordou Adriana, o impacto negativo grande da sociedade abriu às portas para um diálogo, cuja consequência é a ida do Conselho Nacional de Educação aos conselhos estaduais para pedir opiniões, novas propostas. Se depender das turmas de Pedagogia e História, ideias não vão faltar. As turmas saíram do Auditório deixando uma lista de contatos para a criação de grupo nas redes sociais que perdure as discussões. 

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