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A equipe acordou cedo naquele dia. Abriu o porta-malas do carro, que ficou pequeno para tantas bolas, bonecas, carrinhos, jogos, todos devidamente embrulhados em papel colorido, e seguiu para o endereço já bem familiar: Rua Noronha Torrezão, 217. Não muito distante dali, os meninos acordavam felizes para mais um sábado, dia da Casa das Irmãs, dia de recreação, dia de acolhimento, Dia das Crianças. A fuga de uma realidade difícil, injusta, a um passo, no apertar da campainha. Ao entrar, logo veriam que aquele era um sábado diferente, com cama elástica, tererê para os cabelos, maquiagem, “tatuagens” de tinta, videogame, futebol, apresentação de dança e até ponto de parada na cozinha, colocando a mão na massa. Sem falar nos presentes.

O Setor de Ação Comunitária do Unilasalle-RJ realizou no dia 15 uma comemoração repleta de afeto para as crianças e jovens de comunidades carentes assistidos pelo Desabrochar, obra do Centro Social Vicenta Maria, a residência das Religiosas de Maria Imaculada. Parceiros no projeto desde o início deste segundo semestre, o SEAC mobilizou 13 voluntários, muito deles graduandos, para ministrarem oficinas de inglês, informática e artes aos fins de semana. No último sábado, no entanto, o foco era somente a diversão, em uma espécie de festa adiada do 12 de outubro. Para Claudia Alcântara, 57 anos, e Franciany Rodrigues, 24, a data representou um primeiro contato com aqueles meninos, separados em grupos de cinco para todos rodarem por cada uma das atividades.

Claudia está no 6º período de Pedagogia e, apesar de ser estreante na Casa das Irmãs, é veterana no voluntariado. A lista de ações inclui passagens pela Sociedade Beneficente da Sagrada Família, no Fonseca, e em projetos sociais da Fundação Leão XIII. Às 8 horas já estava jogando bola com as crianças recém-conhecidas. Na hora da entrevista, não segurou a emoção. “Tudo o que envolve criança é um desejo enorme que eu tenho. É importante as tirarmos da rua. A primeira pergunta que me fizeram quando as vi foi se teria comida, lanche. Isso me marcou muito. Quero poder oferecer esta mesa farta para eles hoje, viver junto este momento de alegria, abrir esses presentes com eles”, disse ela entre lágrimas, “De certa forma já vivi isso, morei em um espaço como este, sozinha. Vim do nada, me casei, tive meus filhos, me separei e agora estou recomeçando tudo. Sinto-me uma verdadeira lassalista”.

 

Os olhos cheios d’água lembraram tanto de momentos tristes quanto viveram felicidades na manhã/tarde passada em Santa Rosa. Animada, ela enturmou os mais tímidos e deu conselhos aos mais agressivos. Viu-se ainda mais certa do caminho que pretende seguir: psicopedagogia e pedagogia hospitalar, levando sorrisos para espantar as doenças.

Franciany é mais conhecida no Unilasalle-RJ como a Fran do brownie. A aluna do 5º período de Administração vende os doces para amigos e funcionários, além de ovos de Páscoa na época em que o chocolate é a guloseima mais procurada. No Dia das Crianças promovido pelo SEAC, ela deu o pontapé inicial em um terceiro trabalho, do qual não pretende se afastar tão cedo: “A Livia (Livia Ribeiro, coordenadora do setor) me propôs dar uma oficina de culinária, e fui para a área das sobremesas, onde mais me familiarizo. Hoje vamos fazer uma prévia do que vem por aí. Cada um aprenderá a fazer a massa dos cupcakes, confeitar e, no final, poderão levar o que fizeram para casa. Será uma bagunça gostosa, para apresentar a eles alternativas de uma renda futura”.

 

A sementinha foi plantada no sábado. Ao lado de Claudia, a graduanda lembrou ao primeiro grupo que passou pela oficina de cupcakes, composto por adolescentes, que fazer o bolo da moda pode ser uma boa opção de mercado. O mesmo vale para a programação, ramo de André Montevecchi, de 32 anos. Funcionário da Microsoft, ele ministra a oficina de videogames ao lado da mulher, estudante do Unilasalle-RJ. Vindos do Sul, o casal procurava em Niterói uma opção de voluntariado quando recebeu um e-mail do SEAC.

“Estou conhecendo uma nova realidade, desenvolvendo a empatia, porque cada criança tem uma história diferente. Tudo o que podemos trazer do que temos de melhor, procuramos trazer para cá”, resumiu antes do início das brincadeiras. Montevecchi já está há quase um mês participando do Desabrochar. Nas duas primeiras semanas, para se aproximar mais das crianças optou por desenvolver tarefas lúdicas. “Fizemos uma atividade com o intuito de valorizar o nome deles, empoderá-los como seres humanos, mostrar que eles têm um lugar no mundo importante. No segundo encontro procuramos saber quais eram os interesses. Foi quando vimos uma preferência por videogame”, recorda.

 

Mas e se ao invés de só jogar, vocês desenvolvessem também os jogos? A pergunta lançada por Montevecchi foi um tiro certeiro no estímulo à curiosidade. Começava ali uma série de três aulas para confecção de um jogo simples de computador. Com apenas um encontro, “todos que participaram perguntam agora se vamos continuar”. Se depender dele não há dúvidas, até porque, de tão motivado, o profissional de TI já fala em conseguir parcerias com a Microsoft para os novos alunos. Enquanto este momento não chega, a diferença que fez na vida deles especificamente no dia 15 veio em forma de um dia inteiro de muito Xbox.

COM VOLUNTÁRIOS, MAIS CONCENTRAÇÃO

Há 74 anos instaladas na Noronha Torrezão, as Religiosas de Maria Imaculada estão presentes em 21 países, totalizando 23 casas que seguem o legado da pioneira Vicenta Maria (1847-1890), “abrindo suas portas a jovens do mundo inteiro, para oferecer-lhes a Boa Notícia de Deus da Vida, com gestos, palavras, acolhimento, orientação e serviço”. O espaço em Niterói já foi mantido como internato para meninas, escola, e agora abriga universitárias. As doações são outra fonte de recursos.   

Atual responsável pelo espaço, Irmã Suely avalia a parceria com o SEAC como “muito positiva”:  “Quando todos os voluntários estão aqui o dia rende em atividades, as crianças concentram a atenção, se interessam. Algumas estudantes como a Lea (Lea Margarida Bastos, do 4º período de Ciências Contábeis) nos surpreenderam. Ela ministra a oficina de informática e chegou com um plano de aula, para eles aprenderem a desenhar no computador, montar um jornal, confeccionar currículo”.

 

A Irmã revela que, neste ano, 55 crianças se inscreveram para o Projeto Desabrochar, englobando uma faixa etária de 6 a 17 anos. Três deles já completaram 18 e foram convidados a permanecerem na Casa como monitores. “Esta é uma ação que começou há dez anos. O objetivo do Desabrochar é tirá-los da situação de risco no qual vivem, sejam meninas ou meninos, de qualquer religião. Recebemos crianças sem documentos e ajudamos nesta parte de cidadania, de comprovação para cesta básica, visitamos as famílias, matriculamos em escolas”, resume, “São crianças habituadas a viver na rua, que se auto intitulam garimpeiros de latinhas, e, às vezes, não podem vir porque está tendo tiroteio onde moram, veem pessoas sendo assassinadas. O projeto muda essas realidades”.

Para também ajudar nesta causa, assim como o SEAC, entre em contato com o Centro Social Vicenta Maria pelos números (21) 27112626 e (21) 984004371/4370

Veja mais fotos:

Oficina de tererê e maquiagem

 

Oficina de tatuagem

 

Futebol

 

Apresentação de dança

 

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