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A rede é lançada ao mar em busca de peixes, mas antes de tocar as águas, o emaranhado de fios dança no ar. Microsegundos solidificados em bronze na escultura da filha de pescador. O devoto de São Francisco molda o santo no barro, mas ao tom terra cota se soma o lilás, o azul, o amarelo e o laranja, as cores de azulejos cortados e dispostos em mosaico na obra. A avó homenageia o neto com seus cabelos ao vento a tremular na argila. O mesmo material ganha ranhuras, sulcos, relevo na escultura representando a mãe terra, que chora. O reaproveitamento de materiais para impactá-la menos está em “Bailarina Afro”, construída com jornal e, até mesmo, filtro de papel.

 

 

Essa coletânea de temáticas e técnicas traz diversidade à entrada da Galeria La Salle desde o dia 8 deste mês, quando os alunos do artista Rodrigo Saramago inauguraram a mostra conjunta “Pluralidade Criativa”. O nome tem seu significado comemorado por Angelina Accetta, coordenadora do caminho cultural: “O meu apreço pelo ateliê do Rodrigo é por conta desta exploração do esteio do artista na busca de sua própria poética. São retratos da descoberta da poética, de se acreditar nela e desenvolvê-la. Temos a arte de cada um reunida aqui”. A fala reforça o que Saramago busca há 15 anos, desde quando decidiu dar aulas de escultura, aliás o único fio condutor a ligar todos os trabalhos expostos. 

Sem “ensinar arte a ninguém”, o professor abre seu ateliê em Pendotiba para “dar suporte técnico possibilitando às pessoas desenvolverem seus próprios trabalhos”. Os encontros semanais contemplam atualmente três turmas, em cada qual participam, no máximo, cinco alunos. “Gosto de dar atenção individual”, explica Saramago, “Peço para o meu aluno me trazer referências do que gosta, o faço pensar em um projeto. Eu acredito no expressionismo de cada um, não valorizo tanto estética clássica quanto valorizo acabamento, emoção. Através do traço, da forma, do material que escolhe, do conteúdo retratado, conhecemos um pouco de várias histórias”.

Rodrigo Saramago e Angelina Accetta na inauguração da mostra

De fato são muitas, de personagens dos 9 aos 90 anos de idade, contadas em ferro, cimento, atadura engessada, massa acrílica, papel machê, barro moldado e cozido a 700º. Luiz Otavio é o mais novo da turma. Ainda nem completou uma década de vida, mas já exibe na Galeria La Salle duas obras em arame: “Casal dançando” e “Uniciclo”. Poderia ser surpreendente, para os que não sabem que aos 2 anos ele montava sozinho um quebra-cabeça de mais de 100 peças: “Ele começou com 12 peças, não demorou muito e já estava em um de 150. Percebi que ele tinha habilidade com minúcias, um olhar para o detalhe. E é algo dele. Sinto estar dando oportunidade para o meu filho”. O depoimento vem da orgulhosa Eduarda Martins, de 43 anos, mãe de Luiz Otavio, além de artista responsável pela criação do pescador citado no início da matéria.

O talento passado de geração e geração estava lado a lado na Galeria. Enquanto Eduarda trabalha com o bronze, Luiz Otavio sonha em migrar para o material, já tendo lidado com alguns outros. “O professor Rodrigo faz a estrutura e eu vou enrolando o arame, mas já mexi também com argila e cera”, esclarece o pequeno. Diante de tanta propriedade por trás da timidez, a resposta à pergunta “O que você quer ser quando crescer?”, só poderia ser, art... “Jogador de futebol”, diz prontamente. “Jogador de futebol?” Repete a jornalista, incrédula. Isso mesmo, parece afirmar o olhar curioso do menino de só 9 anos.

O futuro Neymar pode, quem sabe, unir futuramente o dom com o amor pelo esporte. Gloria Marchesini segue este caminho. Paisagista, ela busca sempre incluir plantas em seus trabalhos, e o resultado são “obras vivas”, como afirma.    

Espartilho de suculentas por dentro, uma bota com cactos sugerindo uma perna, bromélias voando acima de uma cabeça. Essas são algumas das combinações entre natureza e argila que a artista vem apostando. “Gosto desta mistura, minha obra não é estática. Busco um caminho diferente da maioria que trabalha com o barro e se atém muito ao caráter místico. Tem igual valor, mas não é a minha proposta”, afirma. Outra vontade de Gloria é experimentar, unindo materiais como arame e ferro para dar os toques finais a cada peça. Numa das esculturas expostas, por exemplo, o rosto da mulher que chora se desdobra em uma gaiola, onde os passarinhos estão soltos, mas o verde está preso.

 

Para Gloria estar na Galeria é poder “ver como as pessoas recebem a minha arte”, além de “despertar no jovem de passagem a vontade de colocar a mão na argila. Eu mesma achava que não ia conseguir, e na primeira aula já tinha produzido alguma coisa. Todos podem fazer o mesmo’, conclui lançando a rede para fisgar outros espectadores transformando-os em artistas.

Pluralidade Criativa fica em cartaz até o dia 8 de dezembro.

 

Por Luiza Gould

Fotos de Camila Reis

Ascom Unilasalle-RJ

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