Menu

Naquele dia, Domingos Garcia, Filipe Pedroso e João Alves receberam uma missão, impossível à primeira vista. Dom Pedro de Almeida, governante da capitania de São Paulo e Minas de Ouro, viria a Guaratinguetá e os três precisavam conseguir uma grande quantidade de peixes para a festa que se aproximava. O tempo, no entanto, não era propício à pesca. Cientes do desafio, os amigos rezaram, pedindo a intervenção de Nossa Senhora. Foram várias redes lançadas às águas e puxadas novamente ao barco vazias. Até que, na altura do Porto Itaguaçu, veio um sinal. João jogou sua rede e trouxe para si uma imagem de Nossa Senhora da Conceição, apenas em corpo. Novo arremesso, nova surpresa. Desta vez, o pescador tinha nas mãos a cabeça, componente a encaixar-se perfeitamente na peça encontrada logo antes. João lançaria ainda seu material de trabalho uma terceira vez no rio e a quantidade de peixes a encher o barco foi tamanha que os três partiram apressados para o porto, antes da canoa virar. Era outubro de 1717 quando se deu o milagre de Aparecida. Trezentos anos depois, 46 lassalistas saem em romaria no resgate dessa história, a fé ecoando nos corações de quem por ela é movido.


A partida foi no dia 19 de maio. Reunidos na Capela Universitária La Salle, os romeiros iniciavam às exatas 22h30 a Vigília em Ação de Graças aos 15 anos do Centro Universitário La Salle do Rio de Janeiro. A luz das velas a tremular no altar e nas mãos de cada um parecia apontar em direção ao Santuário, o manto azul de Nossa Senhora a envolver Niterói e São Paulo, fazendo a distância de 565 km parecer pequena. E era, frente a quantidade de aniversários a celebrar: os três séculos da aparição, os 110 da presença lassalista no Brasil, o centro universitário debutante. “Vamos meditar sobre a missão de Maria e pedir que ela interceda por nós, para que nos comprometamos na missão de levar a luz da fé para os outros e de ser luz do mundo”, convidava Livia Ribeiro, coordenadora da Ação Comunitária ao início da vigília. O momento espiritual contaria ainda com a partilha do pão, a leitura da palavra de Deus e muitos cantos, tudo acompanhado de perto pelo Irmão Jardelino Menegat, reitor do Unilasalle-RJ.

Às 00h40, ele subiu ao ônibus para, com uma imagem da Virgem nas mãos, rezar um Pai Nosso e uma Ave Maria, como forma de proteção. Cinco horas depois, Livia anunciava a chegada ao Santuário Nacional na fria madrugada do dia 20. A pausa para o café, com mesa montada no lado de fora do ônibus, teve que ser rápida, pois às 6h30 tinha início o compromisso mais importante do dia: a missa, celebrada pelo Pe. Antônio Augostinho Frasson. “Sedes santos como o Pai celeste é santo. Sedes misericordiosos como o Pai celeste é misericordioso. E, assim, todos os valores postos no Evangelho serão colocados em prática e seremos de Deus como os discípulos foram”, aconselhou o sacerdote na homilia para, em seguida, parecer deixar um recado aos lassalistas: “A comunidade se torna 12 milhões de romeiros que passam pelo Santuário neste ano mariano, vocês fazem parte desta história”.

Maria Estela Alcaraz Avila faz parte desta história. A estudante do 5º período de Pedagogia é a primeira intercambista boliviana a estudar no Unilasalle-RJ, também a primeira da La Salle da Bolívia a optar pelo país fronteiriço. Desde janeiro no Brasil, Estela segue conosco até julho, e tem aproveitado todas as chances para estar em contato com a nossa cultura: “Considero Aparecida um sucesso em minha vida, tenho que voltar novamente para ver qual o sentimento que brota uma segunda vez. Conhecer a padroeira do Brasil foi muito especial porque Maria é tão importante na fé que professo... Através dela eu conheci melhor a Deus. Minha mãe é devota, então desde pequena ela me levava para o Santuário de Nossa Senhora de Schoenstatt, presente no mundo inteiro. Eu não conseguia entender nada, mas ela dizia: ‘Conversa com ela, a mensagem vai chegar a Deus’”.

Catequista em La Paz, Estela considera a viagem uma possibilidade de deixar seu testemunho para outras pessoas, haja visto dizeres como o de São Tomás, segundo o qual “você tem que aclamar o Evangelho, falando com palavras se preciso for. Você deve mostrar que vive uma fé”. Elencar o que mais a marcou em Aparecida é um desafio, mas a boliviana aposta na Sala das Promessas. O espaço localizado no subsolo do Santuário Nacional reúne cerca de 70 mil fotografias, além de objetos, carta e testemunhos de devotos que tiveram suas graças atendidas. “Ver aquele teto repleto de diferentes trajetórias me inspirou a, em seguida, ir até a Capela das Velas e deixar a que eu havia usado na vigília, fazendo também o meu pedido”, lembra.

Uma chama a tremular é um pedacinho que Estela deixa de si no Santuário. Já Luana Sanches, de 29 anos, deixa o suor de subir a pé o Morro do Cruzeiro, rumo à vista que talvez mais dê a dimensão do que é Aparecida do Norte. Apesar da “aventura”, a estudante do 6º período de Administração elege este momento e a missa do Pe. Antônio como os mais especiais da romaria. Para ela, fica também na memória os encontros que fez pelo caminho. “Em contato com os funcionários, vi que esse companheirismo, a compaixão de vocês, não existe só no ambiente universitário, é algo que ultrapassa os muros”, avalia Luana, “Sou católica praticante e considero importante o Unilasalle-RJ não só estar sempre junto com os alunos como também ressaltar a questão da religiosidade, que o mundo está precisando tanto”.

Licença poética

Aqui o discurso deixa de ser em terceira pessoa, como o usual nas matérias do site, para ganhar os contornos da primeira pessoa do singular. Afinal, Estela e Luana se somaram também à Luiza, a jornalista que vos escreve. Junto das novas amigas, eu era marinheira de primeira viagem em Aparecida. Junto delas e de outras tantas pessoas especiais (Adriana e suas filhas, Livia e família, Rubens e família, Franciany e sua mãe, Thiago e Fábio, Thais, só para citar alguns que estavam em nosso grupo), vivi uma das passagens mais intensas da fé que me guia.

No emaranhado de memórias, os fios são incontáveis e começam a se misturar ainda na preparação para a romaria, na capela do Unilasalle-RJ, transformada, de repente, em uma espécie de gruta. Do ônibus ficam as lembranças de uma linda criança a repousar no meu colo, do jogo de adedenha em plena madrugada, do bingo no retorno. Sinto ainda o frio do vento cortante às 5h30, um contraponto à beleza da imagem que se apresentava a nossa frente. O café quentinho preparado, com amor, pela Ação Comunitária chegava ao interior como o conforto do abraço da Mãe a nos receber. A Mãe capaz de acolher uma infinidade de fiéis no Santuário repleto até o fim da celebração, indo buscar a benção dos objetos, na Antiga Basílica tomada de romeiros. A Mãe que motiva na passarela da fé os 392,2 metros de comprimento percorridos de joelhos.

A romaria representou, de fato, o significado desta palavra: peregrinação. Na subida ao Morro do Cruzeiro, cada capelinha da Via Sacra ao longo do extenso caminho impulsionava para não desistir. Eu queria superar ali meus limites, por Nossa Senhora e com a interseção Dela. E consegui, com as forças já limitas, as lágrimas no rosto, e a pressão baixa insistindo em tornar meus passos titubeantes. Amparada pelos lassalistas, me senti, depois de passado o susto, plena. Como Estela, também deixei minha vela em Aparecida. Como Estela, também pretendo voltar para acender outra. Quem sabe nos 20 anos do Unilasalle-RJ?

Por Luiza Gould

Fotos de Adriana Torres, Luiza Gould, Maria Estala Alcarez Avila e Luana Sanches

Ascom Unilasalle-RJ

Entre em Contato